“As fontes de informação não podem ser exclusivamente trazidas pelos grandes grupos de imprensa”

Professor Paulo Velasco, do Departamento de Relações Internacionais da UERJ, comenta a cobertura jornalística da guerra em Gaza

Por: Lucas Freire

A população de Gaza vive em estado de terror mesmo durante o Ramadã – mês sagrado de jejum e orações para os muçulmanos. São mais de cinco meses de guerra entre Israel e o grupo Hamas, e sem sinais de trégua, com a cobertura jornalística, a manifestação de líderes de alguns países e de organismos internacionais deixando claro que se trata de uma operação de extermínio. A cobertura massiva dos grandes veículos de imprensa tem colocado uma lupa sobre as questões geográficas e de caráter étnico da região, mas, por outro lado, tem dificuldade em dar conta de informar com precisão sobre o contexto histórico da guerra. 

Como explica o professor Paulo Velasco, do Departamento de Relações Internacionais da UERJ, em entrevista ao LCJ, a equação é muito mais complexa do que aquilo que acaba sendo noticiado. “Percebo que não há a preocupação de tentar entender ou explicar cuidadosamente um conflito que tem raízes muito profundas. As tensões que vemos entre Israel e Hamas a partir da Faixa de Gaza são tensões que se associam diretamente, por exemplo, à necessidade de um povo há décadas de se afirmar como um Estado soberano independente, o que ainda não se concretizou justamente porque Israel não permitiu”, destaca.

“Entendo que não se consegue haver uma cobertura completa, em parte, porque o jornalismo profissional de televisão tem pouco tempo para detalhar muitas questões que são complexas e acaba focando no que é conjuntural e atual. O que pode acabar transmitindo aos  espectadores a impressão de que a questão se resume somente a uma guerra entre Israel e Hamas”, completa o professor.

Foto: Matheus Kalvin

As declarações do presidente da Federação Árabe Palestina do Brasil (Fepal), Ualid Rabah, em outubro do ano passado, soaram como um alerta a respeito de um suposto genocídio midiático promovido pelas grandes empresas de comunicação, ao tomar uma posição partidária no conflito. Na visão de Velasco, não há um partidarismo intencional desses oligopólios, mas a conjuntura e a influência de setores de alto escalão da sociedade – brasileira e estrangeira – ligados a Israel leva esses agentes a receberem mais atenção.

“É um cenário enviesado mas que não se resume à Palestina. Quando pensamos, por exemplo, em conflitos na África, eles são absolutamente silenciados. Ninguém fala mais da guerra do Iêmen, ninguém fala mais da tragédia humanitária que voltamos a ver no Sudão… ninguém está falando disso na imprensa. Em áreas marginais do globo essa atenção é sempre um pouco menor”, diz o professor.

Velasco considera o jornalismo independente uma solução para a questão.“Eu acho que o trabalho da mídia alternativa é fundamental em qualquer sociedade que se pretenda  democrática. As fontes de informação não podem ser exclusivamente trazidas pelos grandes grupos de imprensa, que também têm sua devida importância. Mas a mídia alternativa tem um papel crucial exatamente porque ela tem a capacidade de penetrar em espaços que a grande mídia não entra, seja por falta de interesse ou por questões de segurança”, conclui.

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